Era como um daqueles dias de infância

Natal ou algo parecido

Todo mundo de folga

O tempo não passava

Igual agora

Arrumei as malas e ajeitei a minha casa. Tudo no lugar para quando eu voltar

Mas agora só penso em ir

Fui te buscar

Subimos o morro de carro

A cabana continua pronta para nós

E esse clima próprio que o sítio tem

É uma delícia tirar as comidas do carro, guardar na geladeira

Tanta coisa fresca

Já trouxe tanta gente para cá

Mas faz tempo que não falam comigo

Talvez eu e esses amigos tenhamos desistidos da amizade

Mas continuo só achando

Sem curiosidade para perguntar

Os pássaros ficam aqui ao lado, cantando, morando

Nunca os vejo

Só escuto

Nessa parte da manhã o dia parece desabrochar aos poucos

Algo tão sólido

Quando se vê, é dia por completo

E já não escuto mais os pássaros

Eles fizeram essa manhã acontecer

E quando param de cantar, nunca sei onde estão, já que não os vejo

Aqueles antigos amigos e eu, fizemos belas canções, bem aqui

Essa casa era tão viva

Um entra e sai

As canções falavam do mundo

Algumas nomeadas de sol da manhã

Os pássaros competiam conosco

E todo o mundo cantava junto

Mas agora os amigos se foram para o mundo

E eu talvez mais do que eles, fui mais fundo

Aprendi também na infância que se alguém não faz questão de ti, da tua presença, aprenda a fazer menos questão ainda deste alguém

Assim, subitamente

É uma defesa

Mas não há defensiva maior que o silêncio

E sei lá por que precisamos dessas coisas

Olhe

Repare naquela trilha do outro lado do lago

Ficamos uns três dias sentados ali

E antes disso, um dia inteiro para abrir um espaço na mata

Lembro-me de cada passo

De cada galho cortado

A gente sempre revoluciona assim, rasgando o mundo

E sentados na beira da água, criamos um mundo de canções inéditas

Algumas hoje estão pelas rádios da cidade

Foi a nossa herança

Um salve-se quem puder: peguem as canções que quiserem para vocês

E tinha para todo o mundo

Soubemos dividir

A mídia fala das coisas como se soubessem das verdades

Mas só especulam

Porém vamos mudar de assunto

Esse sítio é o reinício que trouxemos para ele

E não o passado agarrado nesse lugar

Somos bruxos

Vamos transformar esse mundo

Curar esse morro

Do passado saímos soltando as mãos penduradas

Solto todas

Quem quer ir está indo

O mundo flui

Todos livres

Amparados pelas próprias escolhas

Justiceiros

Já sei. Tive uma ideia

Vamos criar um novo lugar para nós?

Acender uma fogueira

Você sabe como eu amo fogueiras

Vamos dormir nessa mata

Ser parte desse mundo

E cantar bem alto

Pra que toda a floresta acorde e cante junto

Pra que os pássaros conheçam nossas notas

Não estamos perdidos

Mas fugimos para cá

Então que a revolução ocorra

Hoje eu não vou voltar pra casa.

Igor Florim

Publicidade