A casa é uma extensão de mim
Essa tarde também
O sol entrando pela janela e querendo me queimar
A casa silenciosa, limpa, vazia
Resta agora um novo combate
Estou esperando uma visita
A vida é a coisa mais louca que existe
Quem vem me visitar é o meu próprio ego
O conheci em laranjeiras
Digo que receberei a visita do meu próprio ego pois ele é assim como eu
Talvez a gente só escolheu nomes e famílias diferentes para nascer
Pois quando nos conhecemos, o mundo parecia implodir
O Rio de Janeiro é sempre essa loucura, a noite viva, o caus urbano instaurado
E eu sou paulista
Mas no Rio de Janeiro me sinto calorosamente carioca
Me perdoem cariocas, não quero ser o que eu não sou
Mas o Brasil é tudo isso
E o brasileiro que eu sou quer conhecer a Bahia ou o Maranhão tão bem quanto conheci São Paulo e Rio de Janeiro… e quem sabe eu me sinta baiano ou maranhense também
Sei lá. É essa noite… esse clima… essa cidade
Tem tanta coisa acontecendo aqui
E esse mundo é apenas aqui. Todo lugar é um mundo solo
Gangues descem laranjeiras nessa noite, gritando, rindo, observando
Talvez eu entre para alguma dessas gangues
Quero conhecer novas pessoas
E dei de cara com o Jason Carlos
A gente se conheceu rindo também, mas não éramos de nenhuma gangue
Parece que esse encontro foi programado
Eu falava sobre teatro para alguns amigos cariocas
Queriam saber dos espetáculos paulistas
O mundo é um intercâmbio, estamos aprendendo um com o outro
Mas esse cara já é o meu parceiro e ele sabe disso
Chegou chegando
Ocupou o bairro
E eu na velha disputa por território
Mas o mundo foi feito para todos então que os instintos caiam por terra nesse planeta
Ficamos algumas horas conversando
Foi o bastante
O tempo voou aqui
E já programamos futuros trabalhos e rolês
Embora aqui no Rio todos falam rolé e não rolê igual os paulistas
Eu quase não fui até lá naquela noite
E agora ele que vem até mim
Vamos fazer um som
Quem sabe quem escutará?
São recados
Versos encantados
Ele chegou rindo e não parou mais
Sei lá. Eu não tenho muitos amigos
Já tive. Alguns se foram… outros eu deixei ao partir
Mas quase todos me deixaram de verdade
E eu como retribuição não tive escolhas para fazer outra coisa
Os deixei
Me deixaram
A vida é isso… não é? Essa solidão
Ninguém mora no seu corpo além de ti
Então… tu é solo
Porém existem amizades que me nutrem de tantas coisas que eu fico eternamente lá – retribuindo
Nós somos amigos
Jason é o meu amigo
Eu sou um cara moderno, Jason, então conte comigo para tudo mas entenda que não irei cobra-lo de nada
Assim como fiz com os que resolveram ir embora da minha vida
Mas se eu fosse dizer para ti o que o meu peito diz, diria: Fique, amigo Jason… vá para onde quiser mas fique… fique sendo o meu amigo
Sou o mesmo para ti
A música que criamos fala de coisas assim
Cantamos muito
Ele conheceu a casa pela primeira vez, disse que vai passar uns dias aqui e quem sou eu para limitar a liberdade que te dei?
Fumamos pelo resto do dia
Bebemos alguma coisa
E na hora do jantar fomos para a cidade comprar qualquer besteira barata que engorde e nos deixe quase sem ar de tanto comer
Ele me disse que é uma cruz
Sim. Ele é isso, uma cruz
Também não entendi muito
“Fernandes”
Foi essa a última pista que ele disse para nomeá-lo
O cara é cheio das poesias enquanto fala
Me estimula a ser tanta coisa
Enquanto de antigos outros amigos eu apenas escondia os meus versos
Pois eu falava com orgulho. Mas ignoravam às vezes então resolvi me calar
Não faço arte para surdos vitais
Preciso que resolvam ouvir e me procurem ou apenas continuem assim
Por opção própria
Surdos vitais
O Jason me contou da sua vida
E ele não é surdo, então eu fiz o mesmo
Contei do que eu já vivi
Ele é o meu espelho
Quanto mais ajudo a pessoa que eu vejo, mais estou sendo ajudado
E quando percebi isso me emocionei profundamente
Eu não esperava nada em troca
Jason! Vamos para o quintal
Sei lá, acender uma fogueira?
Eu tenho pequenos rituais que são magicamente de outro mundo
Talvez você queira ver
E o velho xamã que ele é aceitou o meu convite e ainda fez um ritual muito mais brilhante que o meu
Eu aprendi tanto
Ainda não te contei, mas me fechei por tanto tempo
E agora somos amigos então não preciso mais de esconderijos
E não tenho vergonha de fazer novos parceiros
De admitir que preciso deles
De amar todas as pessoas
Principalmente os que pouco se amam
Essa é a revolução do mundo, velho xamã
E você sabe que eu irei revolucionar a terra toda
É da nossa natureza fazer esse tipo de coisa
Obrigado pela visita
Eu teria tido dias bem mais fechados se você não estivesse aqui
Você quer sair agora? No meio da noite? Vamos
Talvez para algum lugar nas costas do cristo
Mas vamos. A casa ficará segura sozinha, fizemos um belo ritual
Jason, me conte como era…
Mas me fale no caminho, vou me trocar e já saímos
O mundo é uma loucura
E nós uma poesia caótica que todos vão querer ler
Essa foi a revolução
Sair de casa
Fazer um amigo de verdade.
Igor Florim
Fantástico, mas sempre fico esperando alguém morrer.
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no conto? ou na sua vida pessoal? daqui uns 2 dias tem um conto agendado sobre a morte…
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Nos teus contatos
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