Eram os últimos dias do ano
As cidades recém construídas estavam estranhamente movimentadas
Muitas pessoas não paravam de atravessar o oceano pacífico para chegar até aqui
E povoar novos mundos
A vida ainda não parou de desmoronar antigas solidões
E quanto mais doía, mais força precisava ter
Foi quando eu também vim de barco pra cá. Essas terras não são tão calmas como se pensava. Descobrimos que antigos povos sempre estiveram aqui
Alguns fugiram quando chegamos e nunca mais foram vistos
Dizem que foram de barco para outras ilhas
Mas seguimos com muito medo
É como se fossemos intrusos na gaiola de outros pássaros
Porém agora a nossa nova vida tem que ser aqui
Fui em expedição sozinho pela praia hoje ainda antes do sol nascer. Existem coisas que são iguais tanto nos continentes quanto nas ilhas
Alguns guias desencarnados estão por perto
Sem eles, eu não estaria tão vivo como estou
Talvez uma quase vida, mas não tão vivo assim
Sem lucidez
Não desperto
E completamente cego
Quando o sol estava bem forte, resolvi começar a entrar na mata
Talvez eu já tenha chegado bem longe
Mas parece que ainda falta muito
Voltei pra cidade e as pessoas estavam todas reunidas na praça tentando falar
E ninguém escutava coisa alguma
Somente aos berros gritavam seus orgulhos e medos – a fim de afastar pra longe todo o mal, numa terra onde nós fomos o próprio mau em confronto com outros seres
Tentando erguer o nosso reino
Talvez eles nunca saibam, mas também fomos expulsos de nossas velhas terras, quando o mar levou tudo pra dentro
Agressivamente varreu enormes terras que agora também são mar
Ouve-se que nessas grandes ilhas que estamos, o mar também fez a mesma coisa em outros tempos para deixar apenas ilhas afloradas nas águas e nenhum continente
Separando o joio do trigo
O confronto foi inevitável
A noite caiu e junto com ela, quase deixamos de existir
Os céus flagelaram tudo o que somos
Cometas, grandes naves estelares e animais que são como homens. Felinos, lagartos… nunca vimos essas pessoas
Porém depois dos homens vermelhos que haviam aqui, ou dos amarelos do alto das árvores ou então dos fortes e inteligentes negros das terras de baixo – nada mais nos faz impressionar
Parece que existem muitos outros seres isolados pelos cantos deste velho planeta. Talvez estejam também tentando sobreviver
Os que vieram dos céus nesta noite queriam nos expulsar da ilha. Parece que atrapalhamos um importante projeto que havia aqui
Essas terras não estão mais disponíveis
Porém nessa noite nós não vamos mais fugir – num mergulho em alto mar buscamos novas existências
Deslizando entre águas
Sentindo o peso dos oceanos
Tudo em cima do meu corpo
Os agora intraterrenos que vivem em baixo da terra deixaram suas escrituras para trás, falando de antigas cidades em baixo do mar onde tudo ainda funcionava muito bem
Finalmente achamos outro novo mundo
Mas nossos pulmões não parecem prosperar nessas condições
Buscaremos sem fim
Para numa dessas, todos nós irmos além
Existindo
De verdade.
Igor Florim